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CASAIS COM PAZ E VIDA

Procedimento foi aprovado por Lula e contraria o posicionamento de entidades médicas do país, como Anvisa, Conselho Federal de Medicina e Associação Médica Brasileira.

A costureira Gleycy Kelly Almeida Silva, de 31 anos, faz parte da estatística de pessoas que tiveram sequelas após a Covid-19. Em 2022, a costureira teve inflamação no nervo piriforme e fadiga muscular devido ao coronavírus. Sem melhorar com medicação e fisioterapia, ela decidiu procurar pelo ozonioterapia, tratamento que combina a aplicação dos gases oxigênio e ozônio medicinal no local da dor.

Embora Gleycy Kelly diga que ela tenha apresentado uma diminuição dos sintomas com o procedimento, há duas problemáticas que rondam essa terapia. Em primeiro lugar, não há estudos científicos robustos que comprovem sua segurança e eficácia. Em segundo, ela não é liberada para ser aplicada dessa forma pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Esses são dois dos motivos que causaram rebuliço entre a comunidade médica depois que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, no dia 7, a lei que permite o uso da ozonioterapia como tratamento complementar em todo território nacional.

A decisão contraria o posicionamento de diversas entidades médicas do país.

De acordo com a lei, proposta pelo senador Valdir Raupp (MDB-RO), a ozonioterapia só pode ser realizada por profissionais de saúde com nível superior completo e poderá ser aplicada apenas com equipamentos regulamentados pela Anvisa.

O que dizem as entidades médicas

As recomendações da lei, na prática, são controversas. Em nota sobre o assunto, a Anvisa reforça que o uso da ozonioterapia com segurança e eficácia só é indicado na área odontológica — para tratar cárie, periodontite (inflamação grave da gengiva) e canais dentários e auxiliar na recuperação tecidual após uma cirurgia bucal — e estética, para auxílio à limpeza e assepsia de pele.

Ainda de acordo com a agência reguladora, a ozonioterapia até pode ser usada para outros objetivos, desde que estudos comprovando a eficácia e segurança do uso do gás de ozônio medicinal em tais circunstâncias sejam realizados. Caso contrário, a prática acaba constituindo uma infração sanitária.

A terapia também não é incentivada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Em 2020, quando profissionais diziam que a ozonioterapia era indicada para tratar a Covid-19, o órgão se posicionou contra a prática.

Mais tarde, em 2021, a Associação Médica Brasileira (AMB) também se posicionou contra o projeto de lei que visava a liberação da ozonioterapia como terapia complementar em todo o país.

Em nota oficial sobre o assunto, a entidade reiterou que o procedimento não possui evidências científicas o suficiente para comprovar sua eficácia e segurança, logo, ele não deve deixar de ser considerado como tratamento experimental.

O perigo de práticas pseudocientíficas

Para a infectologista Luana Araújo, que ganhou destaque ao depor na CPI da Covid-19 a favor da ciência, o projeto de lei é vago. “Ele abre portas para uma má prática médica de uma maneira gravíssima. Além disso, favorece um grupo de pessoas que não está ligado somente à ozonioterapia e a essa pseudociência, mas a outros graus de charlatanismo, como o movimento antivacina”, ressalta a especialista.

Luana lembra que esse tipo de situação já aconteceu outras vezes no país, como foi o caso da fosfoetanolamina, popularmente conhecida como “pílula do câncer”.

Em 2016, a lei que permitia a comercialização do produto foi sancionada pela presidente da época, Dilma Rousseff. No entanto, dois meses depois, o Supremo Tribunal Federal (STF) vetou o decreto após a AMB pedir sua suspensão, já que não havia estudos que comprovassem a eficácia e segurança do medicamento.

A infectologista espera que isso também aconteça em relação à ozonioterapia. “Mas o processo gera um desgaste imenso de precisarmos lutar pelo mínimo de bom senso na mais alta corte judicial do país. [A aprovação da ozonioterapia] é a utilização de dinheiro público em pseudoterapia, sem nenhum tipo de comprovação, quando nos falta o básico, quando muitas pessoas carecem do mínimo de atendimento”, reflete Luana.

A prática da ozonioterapia não é desencorajada apenas no Brasil. Em 2019, a Food and Drug Administration (FDA), que corresponde à Anvisa nos Estados Unidos, afirmou que “o ozônio é um gás tóxico sem nenhuma aplicação médica conhecida como terapia específica, adjuvante ou preventiva”.

Além disso, a agência reguladora defende que para o gás ser efetivo como um germicida, ele deve ter uma concentração maior do que aquela que é tolerada com segurança por seres humanos e/ou animais.

Para que serve a ozonioterapia?

De acordo com a Associação Brasileira de Ozonioterapia (Aboz), a combinação dos gases oxigênio e ozônio medicinal melhora a oxigenação das células e fortalece o sistema imunológico.

Ao ter uma ação anti-inflamatória e analgésica, a ozonioterapia tem sido proposta como tratamento para uma série de doenças, desde hérnia de disco e feridas crônicas até câncer e HIV/Aids.

Os diferentes tipos de aplicação da ozonioterapia

Como no caso de Gleycy Kelly, a ozonioterapia pode ser realizada no local da dor, por meio de injeções. Além disso, ela também pode ser feita de forma retal e vaginal, com a aplicação realizada por meio de sondas.

O tratamento também pode ser cutâneo, com a aplicação na pele de óleo, gás ou compressas contendo ozônio. O gás também pode ser colocado de forma auricular, por meio de um aparelho específico para a região.

Contraindicações da ozonioterapia

A terapia que combina oxigênio e ozônio não é indicada para pessoas que têm hipertireoidismo, hipertensão, diabetes descompensado e anemia grave. Ela também não é recomendada para gestantes.

Devido à falta de evidências científicas sobre o assunto, a maioria dos efeitos colaterais da ozonioterapia ainda é nebulosa. O pouco que se sabe é que o tratamento pode causar reações alérgicas, lesões na pele e problemas respiratórios.

Fonte: revistamarieclaire

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